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O Candidato E O Caipira

Zé Fortuna E Pitangueira

- Olá caboclo, bom dia. Então, como vai você?
- Vou indo bem, seu Dotô, mas me descurpe eu dizê eu não conheço o sinhô. Quem tu é, posso sabê?
- Ora, caboclo, nunca ouviu falar do Dr. Pereira? Fui prefeito há muito tempo no Arraial das Caneleiras.
- Ah! Já ouvi falar do seu nome, mas o que eu tô admirado é que eu nunca vi o doutor andando por estes lado e hoje por que razão abandonou o povoado? Prá vir conversá na roça com um caboclo pé-rapado?
- Aí é que está o motivo de eu vir lhe visitar: pensei em você que passa o dia todo a labu capinando a terra dura sem ninguém lhe auxiliar. Por isso eu deixei a cidade e vim aqui lhe ajudar.
- Mas doutor, tô até envergonhado só de ouvir o senhor falar, o senhor deixou a cidade pra vir aqui me ajudá? O doutor tem as mão fina, num vai se acostumá Doutor, o cabo da enxada vai suas mãos calejá. Bem, mas já que o senhor insiste vou uma enxada lhe arrumá.
- Não, não, não, não é isso que eu quero. Você entendeu mal, o fato é que as eleições vem aí e eu sou um dos candidatos.
- Bem que achei impossível tanta fartura hoje em dia! Quando o milagre é demais até o santo desconfia.
- Mas como eu estava dizendo. Eu quero, se for eleito, lhe auxiliar na assembléia defendendo seus direitos, enquanto você trabalha de sol a sol aqui no eito, eu luto para que a Pátria reconheça o vosso feito. Eu vim pedir o seu voto, que é a arma do cidadão, com ele você me elege e formamos a união para juntos construirmos a grandeza da Nação!
- Muito bonito, Dotô! Sua fala doce tem mé. Mas tu qué sarvá a nação lá na cidade, não é? Mas pegá no guatambu de sol a sol tu num qué! Pois daqui depende a Pátria, das lavoura do sertão. Destes campos, destas matas, dos calos de nossa mão, desses caboclo que luta sem nunca ter recompensa, sem estrada, sem recurso, sem remédio pras doença, e o Dotô se for eleito já qué aumento dobrado desse tar de subsídio que o pobre chama ordenado. E prá que desigualdade se somo igual brasileiro pois ganha mais tu num dia do que o pobre o ano inteiro?
- Mas é justo que devemos ganhar mais do que vocês, pois o que eu gasto num dia, você não gasta num mês.
- Não gasto porque não tenho, mas bem que eu sei o que é bom! Ah, se eu pudesse possui automove, televisão. Por isso o certo seria vocês num ter ordenado, prá vê quem era no duro, um democrata apurado. Garanto que ninguém mais queria ser deputado, e tem mais, se aqui a seca acabá com as plantação, não aparece ninguém oiá pra nóis no sertão. E por que só vem agora nas época de eleição?
- É porque não temos tempo de abandonar a cidade, ocupado com os problemas que afligem a sociedade.
- Óia outro erro, Dotô, se eu fico sem trabaiá, o patrão me manda embora, não tenho com quem queixá, e vocês lá na assembléia se quizé pode fartá um ano inteiro e recebe ordenado legar. Se um dia o pobre caboclo cansado da dura lida fizé um erro, coitado, tá preso por toda a vida, enquanto vocês, Dotô pode errá a vontade, não tem cadeia porque goza da imunidade. Por isso me dá licença tenho outra ocupação. Meus fios, pega a enxada e vamo entrá no taião, essa conversa, Dotô, num enche barriga, não.






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