Para Nerve, Abrantes é uma cidade tão boa para deambular como outra qualquer. No fundo, tendo em conta o panorama Hip Hop Nacional, não são muitos os MCs, independentemente da cidade de origem, que apresentam um início de carreira com tanto buzz ainda antes de completar duas décadas de vida. O EP lançado para o mundo virtual com o sugestivo nome “Promoção Barata” e a participação na compilação Matarroêsa “Bota Sentido”, ambos em 2006, fez despertar a curiosidade e por ocasião do lançamento do seu primeiro trabalho “Eu Não Das Palavras Troco a Ordem” não são poucos os que estão de atenções voltadas para a mais recente aquisição da editora Matarroa. Por isso, Nerve nunca dorme. Tem a retina queimada das luzes néon, flashes, alta velocidade, fumo e sirenes. O turbilhão que é a cidade tomou-o de assalto e quis moldá-lo à sua imagem e semelhança. Mas o processo não correu bem. A solidão, a angústia e a loucura levam à mistura de realidade com paranóia que faz de ENPTO um estupefaciente que vicia logo à primeira audição. É contraditório, caótico, é o desespero de um psicopata que se quer reencontrar consigo próprio e redescobrir a sua faceta humana há muito perdida. Nerve não se preocupa. Nerve é um detective sublime. Um galã tão desarmante como detestável. Um assassino contratado com medo da própria sombra. Um super-herói de sentimentos elevados e fantasias condenáveis. O falhado que olha para a vida como um comboio há muito perdido… É, no final do dia, um romântico irrecuperável que não compreende quando é que a vida lhe trocou as voltas. Só uma coisa é certa, a culpa nunca é dele. A paisagem interior que Nerve cria não está deserta, pelo contrário, encontra-se pontilhada de participações igualmente geniais. Martinêz abre novamente a caixa de Pandora, Stray faz vibrar a primeiríssima faixa de Halograma alguma vez editada em CD, Blasph estala os dedos e alarga o colarinho enquanto acompanha Nerve num ‘trabalho’ por encomenda e Viruz é a desafiante counterpart num show de flow e skill. Notwan marca a sua presença inconfundível com os instrumentais mais detalhadamente excêntricos, embora a produção esteja maioritariamente a cargo do próprio Nerve, com uma marcante aparição de SP & Wilson. Nerve é tudo aquilo que cada um de nós é enquanto espera pelo autocarro, quando sai do emprego, quando está na fila do supermercado. Com doses extra de adrenalina à mistura.