Lixomania (BRA) - Punk Rock. É uma banda lendária do Punk Rock brasileiro, pois foi uma das pioneiras do movimento no país, ao lado de Olho Seco, Cólera e Inocentes, entre outras. A banda foi formada em 1979, no bairro do Lauzane - zona norte da cidade de São Paulo (SP) -, pelos amigos Adauto (baixo), Tikinho (guitarra e vocal) e Zú (bateria). Depois entrou Alê, que assumiu os vocais. Todos gostavam de Sex Pistols, Ramones, The Clash, Stiff Little Fingers, UK Subs, Dead Boys, Sham 69, Lurkers e muitas outras bandas.
Em 1980, com alguns ensaios e apenas três músicas no repertório, a Lixomania fez a sua primeira apresentação num encontro inédito de bandas punks, realizado a portas fechadas (sem público) em Santo Amaro, na zona sul da cidade.
No decorrer de 1980 e 1981, a banda seguiu apresentando-se em locais distantes da periferia de São Paulo. Nenhum clube ou danceteria da cidade abria espaço para shows punk. Em meio a muitas dificuldades, a Lixomania acabou conquistando o apoio da emergente platéia punk e destacando-se como uma das principais bandas punks do Brasil.
Além da música e da atitude, um de seus grandes méritos é o de ter ajudado a desbravar o caminho para o surgimento de uma cena punk no país, que ainda vivia sob a censura e as leis impostas pelo regime militar do general Figueiredo. Nessa época, a imprensa e a mídia brasileira ainda não haviam descoberto o punk. Isso só veio a acontecer em 1982, refletindo o renascimento do movimento no exterior, com The Exploited, Discharge, Dead Kennedys, Black Flag, etc.
O ano de 1982 foi muito importante para a Lixomania. Com a saída de Alê, Moreno (um antigo simpatizante da banda) assumiu os vocais, enquanto Miro (ex-Guerrilha Urbana) substituiu Zú na bateria. É com essa nova formação que a Lixomania gravou o EP “Violência e Sobrevivência”, lançado em setembro de 1982 pelo selo independente Punk Rock Discos, de São Paulo, sob direção e produção de Carlos Marçal Bueno, cunhado de Betão, amigo e simpatizante da banda.
Hoje, esse EP contendo 6 músicas (Violência e Sobrevivência, Massacre Inocente, O Punk Rock Não Morreu, Zé Ninguém, Fugitivo e Os Punks Também Amam) é disputado por colecionadores de discos punks em razão de seu pioneirismo: foi o primeiro disco de uma banda punk lançado no Brasil, precedido apenas pela coletânea “Grito Suburbano”, que reunia 3 bandas de SP.
A capa do EP foi feita a partir de uma colagem de manchetes de jornais que retratavam a violência e criminalidade no país. O trabalho de arte é creditado ao escritor Antonio Bivar (autor do livro “O que é Punk”), Fernando Santa Rosa e Lixomania. Os temas das músicas são a violência (“Violência e Sobrevivência” e “Massacre Inocente”), as injustiças sociais (“Zé Ninguém” e “Fugitivo”) e o próprio movimento punk (“O Punk Rock Não Morreu” e “Os Punks Também Amam”).
Com o disco debaixo do braço, a Lixomania pôs o pé na estrada, fazendo shows em cidades do interior de SP. Ainda em 1982, participou do festival “O Começo do Fim do Mundo”, realizado no Sesc Pompéia, em São Paulo, e teve uma de suas músicas (“Punk”) incluída no disco resultante do festival. Com a repercussão do evento – considerado o mais importante da história do punk nacional - , a Lixomania foi convidada a tocar fora de SP, realizando várias apresentações no Rio de Janeiro (que incluiu um show no Circo Voador, com abertura do Paralamas do Sucesso, Kid Abelha e As Abóboras Selvagens) e um show no estádio de Juiz de Fora, no estado de Minas Gerais, assistido por milhares de pessoas.
O problema é que a Lixomania e a maioria das bandas Punks remavam contra a maré. No momento, toda a atenção das grandes gravadoras, rádios, revistas, jornais e TVs estava voltada para os novos artistas de estilo pop/rock (Blitz, Lulu Santos, Kid Abelha, Léo Jaime, Ritchie, Gang 90, Lobão, etc). Não bastasse a hostilidade da mídia em geral, os punks ainda tinham de lidar com a falta de equipamentos e espaços para shows, a repressão policial e as brigas constantes entre gangues. Uma das últimas apresentações da Lixomania nessa época, ocorrida no programa Fábrica do Som, da TV Cultura, mais uma vez culminou em confronto entre gangues rivais. Assim, em março de 1983, a Lixomania resolveu encerrar suas atividades.
A herança da Lixomania e do punk paulista
A exemplo da Lixomania, várias bandas punk desapareceram (algumas sem deixar qualquer vestígio de registro sonoro) e outras continuaram restritas ao circuito “underground”. O novo cenário musical passou a ser dominado pelos ícones do chamado BRock (Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Titãs, Capital Inicial, Ultraje a Rigor, etc). No entanto, a Lixomania e as bandas punks de SP já haviam deixado a sua mensagem. Pelo menos com relação às letras, pode-se perceber ecos do inconformismo e irreverência punk em músicas de sucesso como “Inútil” (Ultraje a Rigor), “Polícia” (Titãs), “Que País É Este?” (Legião Urbana), “Veraneio Vascaína” (Capital Inicial) e “Até Quando Esperar” (Plebe Rude), entre outras. Sem falar em bandas como Camisa de Vênus e Replicantes, claramente inspiradas no punk.
Com o fim da banda, Miro formou o 365 e, em meio à explosão do novo rock nacional, atingiu um público mais amplo com o single “São Paulo”, executado em rádios FM. Num primeiro momento, Tikinho e Adá participaram do 365, mas depois deixaram a banda.
Entre 1994 e 1996, Adá voltou a tocar com amigos da zona norte, integrando as bandas de garagem Sidflex, Sobreviventes e Outsiders. Depois disso, reuniu-se novamente com Tikinho e Miro, incluindo Muniz (ex-Fogo Cruzado). A idéia era reativar a Lixomania, mas não deu certo. Tikinho saiu logo no ínicio; Muniz assumiu a guitarra e os vocais e, junto com Adá e Miro, formou um novo Fogo Cruzado. Em 1997, a banda lançou um CD que inclui a música “Presidente”, da Lixomania. Adá deixou o grupo antes mesmo do lançamento do disco e Miro, logo depois.
Em outubro de 2002, a Lixomania voltou finalmente à ativa com sua formação clássica (Moreno, Tikinho, Adá e Miro) como convidada especial do festival “O Fim do Mundo – 20 Anos de Cultura Punk”, realizado no Tendal da Lapa, na zona oeste de São Paulo. A banda foi a única a fazer duas apresentações no festival, que reuniu, durante uma semana, mais de 60 bandas de todo o Brasil.
À partir dessas apresentações e do incentivo dos fãs, a Lixomania voltou a ensaiar regularmente e, em 2003, fez um show no Hangar 110, em SP, na tradicional Festa do Ratinho, matando a saudade de muitos fãs que compareceram ao evento. A banda apresentou 19 músicas (algumas delas inéditas) que farão parte, em breve, de um CD da Lixomania.
A gravadora Speed State Records, do Japão, também lançará em CD e vinil, em edição especial, o EP da banda (de 1982) + material inédito, como parte de um projeto que visa agrupar gravações das principais bandas punks do mundo.
Segundo Tikinho, a idéia do nome “Lixomania” surgiu a partir dos comentários da vizinhança da casa onde a banda realizava os seus primeiros ensaios. Todos os vizinhos diziam que o som era uma sujeira, um verdadeiro lixo, como se os membros da banda tivessem mania de lixo. Inicialmente, eles cogitaram adotar o nome “Mania de Lixo” mas, após mais discussões, surgiu o nome definitivo da banda, “Lixomania”.