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A Vaquinha

José Fortuna

Aquela pobre vaquinha indo para o matadouro
tão velha e magra que tem os ossos furando o couro.
Parece que ela adivinha que caminha para o fim
se ela pudesse dizer, talvez nos diria assim

Meu boiadeiro, me levando à morte, dei minha vida para lhe ajudar
meu leite puro é que matou a fome de seus filhinhos, que ajudei criar.
E os meus filhinhos você levou embora, uns para o corte, outros pro estradão.
Puxando carro pelo chão do mundo, de dor sangrando pelo seu ferrão.
Um obrigado eu esperava ouvir agora, porém só ouço a chicotada da partida
meu coração entristecido está chorando, a ingratidão de quem tanto ajudei na vida.

Hoje estou velha pra mais nada presto, a minha morte só lhe satisfaz
vivi a vida só lhe dando lucro, sem o direito de morrer em paz.
Quando sua faca atravessar meu peito e o meu sangue lhe escorrer na mão.
Por sua pobre ignorância humana, meu boiadeiro, lhe darei perdão.

E, após a morte, eu serei seus passos, no seu calçado feito com meu couro
serei o cinto pra enfeitar madames, serei a bolsa pra guardar seu ouro.
Desde o início da humanidade, quando em Belém viram a divina luz,
com o meu calor, na fria manjedoura, fui eu que um dia aqueci Jesus.
Um obrigado eu esperava ouvir agora, porém só ouço a chicotada da partida
meu coração entristecido está chorando, a ingratidão de quem tanto ajudei na vida.







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