o poeta deixou-te uma lembrança
por dentro da lembrança uma memória
em volta da memória uma esperança
que fez de ti o homem e a criança
que lhe entregavas cartas e a História
o poeta deixou-te uma emoção
que encontraste na casa abandonada
que ficava no cimo da lição
do mais alto de ti eis a questão:
poesia eras tu. Ele quase nada.
O poeta deixou-te uma ideia
de como ser feliz ser mais igual.
Não te mentiu. Deu sangue à tua veia
poesia contra a vida se fôr feia
- matraquilhos mas com bola de cristal.
o poeta deixou-te uma saudade
de redes tristes metáforas sinais
p´ra ele tu foste o selo da verdade
o poema impossível liberdade
que tu sonhaste escrito p´los mortais.
o poeta deixou-te um sentimento
que me liberta preso na cadeira
deste cinema onde tu sobes tão lento
na bicicleta contra tudo contra o tempo
contra ti sem Neruda nem bandeira.
deixo-te nada. As coisas vivem mortas
aos pés de um filme à soleira do amor.
no cinema caem lágrimas e cartas
compro o bilhete para amanhã antes que partas:
eu quero ouvir uma vez mais o gravador.