Era num baile
nesse primeiro andar com sacadas
que aos domingos os dois de mãos dadas
ensaiávamos a valsa da vida
essa valsa
eu pisava-te e sentias medo de estragares os sapatos
que tu tinhas comprado em segredo
Era um bairro cheio de vento e de sombra no passeio
tinha medo que me achasses feio
e comprei brilhantina no barbeiro que sorriu
e depois fez tudo quanto pôde para fazer a barba
à penugem que era o meu bigode
e a tua boca que sabia a baton roubado à tua mãe
e às pastilhas de hortelã-pimenta que eu te dava
soube-me sempre àquele gosto que só tem a manhã
que se bebe na roseira brava
Era um tempo que sabia a groselha e a gelado
aos domingos os dois braço dado
ensaiávamos os passos da vida
essa vida em que juntos depois descobrimos que afinal
tudo aquilo é o mesmo que hoje os dois sentimos
Era um bairro cheio de verde e de sombra no passeio
tinha medo que me achasses feio
e comprei brilhantina no barbeiro que sorriu
e depois fez tudo quanto pôde para fazer a barba
à penugem que era o meu bigode